Revisão do Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos – Opção Sobre os “Requisitos”



O presente post é o segundo de uma série de seis (Primeiro, Segundo, Terceiro, Quarto, Quinto, Sexto) sobre o tema:

Camas Paralelas na Cidade – Quando Factos Contrariam Narrativas

O objectivo do presente post é duplo:

-analisar a Proposta da Secretaria de Estado do Turismo e a da Posição da AHP – Associação da Hotelaria de Portugal sobre a proposta do “Hotel sem estrelas” da Revisão Pontual do Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos,

-mostrar que a prioridade do Governo e da Iniciativa Privada é a Revisão Profunda deste Regime Jurídico e nela integrar a simplificação de todos os Requisitos e o Alojamento Turístico Não Classificado.


1.Posições da Secretaria de Estado do Turismo e da AHP – Associação da Hotelaria de Portugal

*Secretaria de Estado do Turismo
Em Abril de 2013, o Secretário de Estado do Turismo propõe a Revisão Pontual do actual Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos.

Durante o Verão, o Secretário de Estado inclui nesta Revisão Pontual a proposta do “Hotel sem estrelas” – na realidade o SET começa por falar em Empreendimento Turístico Sem Estrelas, o que não é a mesma coisa.

Ignoramos se o SET tem a consciência de estar a inserir uma alteração estruturante no actual Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos, quando o que está em causa é a sua Revisão Pontual.

Em Outubro de 2013, numa entrevista ao Sol, o Secretário de Estado do Turismo explica o que está em causa:

-“Há características que são importantes num determinado segmento e menos importantes noutro. A única forma que temos de permitir que um empreendimento turístico se adapte por completo à procura, é dar-lhe liberdade de o fazer. E isto tanto é válido para os novos como para os actuais.”.

-“Se as exigências das categorias [por estrelas] apenas dificultarem a requalificação dos empreendimentos turísticos, a melhor rentabilização do activo ou a capacidade de concorrerem com formas de alojamento que lhes roubam clientes, como o alojamento local, os proprietários poderão decidir não ter categoria.”.

-“O objectivo é libertar os hoteleiros da classificação do Estado para que possam criar projectos inovadores […] a sua primeira preocupação deve ser agradar ao hóspede e não ao Turismo de Portugal […] “mais importante do que a classificação por estrelas são as classificações informais que o mercado dá, através de sites, revistas e prémios.” (1).

*AHP – Associação da Hotelaria de Portugal
A oposição da AHP à proposta de “Hotel sem estrelas” manifesta-se em várias ocasiões. Destacamos a reunião, a 30 de Outubro de 2013, dos membros dos órgãos sociais da AHP (Conselho Geral, incluindo presidente, Mesa da Assembleia Geral, Direcção Executiva e Conselho Fiscal) com o Secretário de Estado do Turismo. É uma reunião relativa à revisão do regime jurídico dos empreendimentos turísticos, especificamente tendo por objecto a introdução do conceito “dispensa de categoria” (2).

Os participantes aprovam “a nossa posição conjunta”, da qual citamos as partes mais pertinentes:

-“ A consagração de um conceito como a “dispensa de categoria” no regime jurídico dos Empreendimentos Turísticos não merece acolhimento. Não ficou evidenciado nem qualquer objectivo nem qualquer vantagem associada a este sistema, bem como não se conhecem sequer quais os critérios e requisitos.

a)Está por demonstrar que a possibilidade de ser atribuída a categoria de “hotel sem estrelas/dispensado de estrelas” /não categoria” seja um factor de competitividade, e que permita captar investimento ou captar procura.

b)A consagração desta nova categoria/não categoria (“hotel sem estrelas/dispensados de estrelas/sem categoria”) é de impossível compatibilização com a coexistência de um sistema de classificação no nosso país, onde os hotéis são classificados de acordo com os requisitos próprios para atribuição de estrelas.

c) Isto tanto mais que a nível do mercado internacional (quer da procura/consumidores, quer dos OTA/TO (3)), está sedimentada a ideia de estrelas.”.
Por fim:

-“h)Estabelecer esta nova categoria/não categoria fragiliza a indústria hoteleira nacional, quer os que operam actualmente no nosso mercado quer os que pretendam vir a operar; não dá qualquer indicação transparente fidedigna aos consumidores; deixa os operadores perplexos; vem ao arrepio das tendências europeias; não responde a qualquer necessidade efectiva do sector e permite abrir a entrada do Alojamento Local na designação Hotéis, destruindo valor.”.


2.Requisitos e Revisão Profunda do Actual Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos

*Proposta do Hotel Sem Estrela
Consideramos que a Proposta do Secretário de Estado

-pode vir a ser uma boa proposta (4), porque a Classificação Por Estrelas é cada vez mais algo de interno à Oferta e um arcaísmo no Mercado da Viagem Turística, como analisamos em outro Post (Terceiro),

-no imediato, escamoteia a necessidade da Revisão Profunda do actual Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos.

Por outro lado, a Proposta tem o timing errado ao unir a maioria dos empresários contra ela e o SET, quando o importante para o País é

-o SET ganhar o apoio dos empresários que ele próprio refere por “Conseguiram ter uma estratégia de sucesso, apesar do peso do Estado”, de modo a poder contrariar a inércia das posições mais conservadoras dos empresários que se adaptaram a “um sistema que vivia com o Estado como motor e central” (5) e conquistá-los para a Revisão Profunda do actual Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos.

O efeito colateral da proposta do “Hotel sem estrelas” é o ter polarizado toda a atenção que devia ser dada à Revisão do Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos.

*Conceito de Requisitos
No âmbito do presente trabalho, Requisitos refere o conjunto de normas, regulamentos e exigências que o investidor tem de satisfazer durante a aprovação, licenciamento e exploração do Empreendimento Turístico em que investe nos termos do Regime Jurídico do Alojamento Turístico.

Os excessos destes Requisitos são criticados desde há dezenas de anos e sucessivos governos juram que os eliminam, sem que investidores e exploradores de Empreendimentos Turísticos tal reconheçam.

Distinguimos três tipos de Requisitos:

-os da Transversalidade do Turismo: Segurança, Saúde Publica, Ambiente e Informação do Consumidor – boa parte dos custos de contexto dos Empreendimentos Turísticos resultam da maneira como estes Requisitos são definidos e aplicados,

-os que têm a ver com as características do próprio Empreendimento Turístico, caso em que faz todo o sentido a declaração do Secretário de Estado: “a primeira preocupação deve ser agradar ao hóspede e não ao Turismo de Portugal” (6),  

-os que são exigidos pela Classificação Por Estrelas – a Proposta do Secretário de Estado do Turismo tem apenas a ver com estes Requisitos.

*Revisão Profunda do Regime Jurídico do Alojamento Turístico
O que está em causa é o Governo promover uma Revisão Profunda do Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos em vigor, e nela

-incluir a simplificação de Todos os Requisitos exigidos ao Alojamento Turístico,

-integrar, de maneira adequada, o actual Alojamento Turístico Não Classificado.

O Alojamento Turístico Não Classificado é analisado na segunda série de Posts (Segunda). Sobre a simplificação dos Requisitos, dispomos de uma proposta concreta que apresentamos a seguir.

*Simplificar Requisitos – Proposta Concreta
Em 2012, José Theotónio, CFO do Grupo Pestana (7), faz uma proposta concreta:

-“Sobre a actividade hoteleira impedem um conjunto de normas, regulamentos, seja na fase de aprovação e licenciamento da actividade seja na fase de exploração que só acarretam custos acrescidos para as empresas e não têm nenhum valor acrescentado para o cliente, quer em termos de segurança, quer em termos da melhoria da qualidade de serviço.”.

-“As empresas turísticas portuguesas têm hoje um deficit de competitividade com as suas concorrentes internacionais porque têm de suportar legislação da mais diversa ordem, sem qualquer valor acrescentado para o cliente e com custos acrescidos para as empresas. O objectivo é analisar toda a legislação que regula a actividade em países europeus e adaptar aquela que for mais “friendly” do ponto de vista empresarial. Ou seja copy e paste da legislação do país europeu mais favorável à competitividade dos destinos das empresas portuguesas.”.

Depois de um texto tão claro e objectivo, ao Governo compete lançar a Revisão “a sério” do actual Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos.

*Simplificar Requisitos – Equívoco da AHP
Sobre Hostels, a Presidente Executiva da AHP afirma (8):

-“Estes estabelecimentos, embora se destinem a alojamento de turistas, funcionam com uma mera licença de habitação, e estão excluídos das regras de funcionamento, transparência e fiscalização de hotéis.”.
Este discurso ilustra o equívoco da AHP sobre a simplificação dos Requisitos:

-deixa a mensagem que consideramos errada: aplicar a Novos Tipos de Alojamento Turístico (Hostels, B&B e Inns da Booking.com) os Requisitos excessivos da Hotelaria, e não os que o mercado exige a este alojamento diferente,

-omite a mensagem que consideramos prioritária: vamos “limpar” os Requisitos exigidos à Hotelaria e adequá-los às exigências do mercado, e para os estabelecimentos menos sofisticados, ter em conta diferentes exigências que variam segundo posses, ciclo e estilo de vida, novas gerações etc.


A Bem da Nação

Albufeira 23 de Novembro de 2013

Sérgio Palma Brito

Notas

(1)Entrevista ao Sol de 25 de Outubro de 2013

(2)Ver o texto completo da Nota da AHP de 31 de Outubro de 2013 em

(3)Online Travel Agencies e Tour Operadores.

(4)Recordamos que, já em 2004, apoiamos o então o Secretário de Estado Luís Correia da Silva, na criação do que poderia vir a ser um “Empreendimento Turístico atípico e sem estrelas” – nesta como noutras matérias, não somos cristão-novo. As críticas dos meios mais conservadores da hotelaria tradicional foram violentas. A título de exemplo, no Turisver de 5 de Fevereiro de 2004, Carlos Torres, um dos mais acérrimos defensores da “hotelaria tradicional”  critica “a intenção governamental por instituir um sistema meramente facultativo da classificação dos empreendimentos turísticos”.

(5)Entrevista ao SOL de 9 de Abril de 2013

(6)Declarações ao Sol de 25 de Outubro de 2013.

(7)José Theotónio, Chief Financial Officer do Grupo Pestana, em Raul Martins, Francisco Sá Nogueira, José Theotonio e Jorge Vasconcellos e Sá, Crescimento (sem Keynes) no Turismo, Vida Económica 2012.


(8)Declarações a Publituris Hotelaria, 1 de Outubro de 2013)

Sem comentários:

Enviar um comentário