O Algarve às Sextas (2012.04.06)
Penina e Vale do Lobo – Inovar em 1963



Em 1963, Penina e Vale do Lobo são empreendimentos inovadores. O seu licenciamento é exemplo inspirador da Politica que falta à Economia do Turismo do Algarve: contra pareceres dos Serviços de Turismo, o Ministro das Obras Publicas aprova dois conjuntos de Hotel e Golfe, mais Moradias “cuja venda contribuísse para custear as despesas do empreendimento e aumentar a rentabilidade do projecto”, como pretendiam os promotores.

A partir deste precedente, podemos esboçar o que será Inovar em 2012.



Ao leitor mais interessado, sugerimos a consulta imediata do Documento de Trabalho, que apoia este post (Documento), e do post sobre A Politica Que Falta à Economia do Turismo do Algarve (Documento1)



a)Inovar em 1963



Þ     A Dupla Dimensão da Inovação

Em 1963, a primeira inovação reside na iniciativa privada. Os projectos da Penina e Vale do Lobo inovam, pela sua extensão (cem e mais hectares), pelo golfe e pela venda de moradias, para responder à procura e financiar os projectos.

A segunda inovação reside no seu licenciamento, pelo Ministro das Obras Públicas, e a sua expressão concreta está no terreno:

·          sem as decisões do Ministro, os empreendimentos turísticos da Penina e Vale do Lobo não existiam hoje.



Þ     1962/1963: Duas Iniciativas Empresariais

Em Abril de 1962, o compromisso público do Governo em construir o Aeroporto de Faro marca o «antes» e o «depois» do Turismo do Algarve. A partir do Verão/Outono, fervilham iniciativas privadas de investimento no futuro Turismo do Algarve.

Uma dessas iniciativas é a da Sociedade Agrícola da Penina, SARL, inicialmente criada para a exploração agrícola da Tapada da Penina. No final de 1963, passa a Sociedade Turística da Penina, SARL, e o seu rosto é John Stilwell, uma das mais respeitadas figuras do Turismo do Algarve

A outra iniciativa é da Costain e Leackok Ltda., que sucede à Brochurst Leacckok & Cia, por alteração do pacto social, em Janeiro de 1963. Richard Costain tem importante actividade de construção e promoção imobiliária em Inglaterra e está associado à família Leackok, da tradição da Madeira. Depois, a partir de 1979 e durante quase trinta anos, Sander van Gelder é o empresário de Vale do Lobo – respeita a regra de ouro do bom promotor imobiliário, o que faz surf nas vagas da sociedade e da economia: compra “na crise” e vende “na euforia”.



Þ     Os Projectos da Penina e Vale do Lobo

Na Tapada da Penina, o projecto integra um Campo de Golfe “aproveitando as magníficas condições climatéricas do Algarve durante o Inverno proporcionasse divertimento aos hóspedes, constituísse um poderoso atractivo e permitisse uma maior valorização do conjunto. Escolheu-se a quinta da Penina exactamente porque tinha área suficiente para o Campo de Golfe, possuía bastante água e permitia ainda aproveitar o terreno sobrante de 65 hectares para a divisão de lotes, cuja venda contribuísse para custear as despesas do empreendimento e aumentar a rentabilidade do projecto.”. Este curto texto do Relatório de 1966, resume o que ainda hoje está em causa.

Vale do Lobo ocupa cerca de 100 hectares, com 820 metros de praia. O projecto inicial prevê 1.750 pessoas, um Hotel que pode ter 160 quartos, golfe e “Moradias para aluguer e venda”. A dinâmica é similar à do projecto da Penina.



Þ     Posição dos Serviços e Turismo

Os Serviços de Turismo lidam com uma oferta de turismo limitada aos Estabelecimentos Hoteleiros da Lei 2 073: “Hotéis, pensões e hospedarias; pousadas e estalagens”.

Em Penina e Vale do Lobo, são confrontados com empreendimentos turísticos de cem e mais hectares, com um Hotel, Golfe e Moradias para venda. Perante esta nova realidade, tomam duas posições:

·          em Vale do Lobo, há uma oposição oficial à venda de moradias e andares, seguida de recuo,  uma vez tomada a decisão do Ministro das Obras Públicas,

·          na Penina, não encontramos traça de oposição oficial à venda de moradias, apenas um «fechar os olhos».

Nos dois casos, os Serviços de Turismo acabam por apenas Licenciar o Hotel, com o Golfe entre “as instalações desportivas complementares”, e não ter em consideração a envolvente de moradias.

São exemplos premonitórios do futuro: legislação turística inadequada e incapaz de regular a realidade da procura/oferta, Politica e Serviços de Turismo a ignorar ou hostilizar o turismo residencial e formação de uma Oferta de Turismo fora de um estreito âmbito da sua intervenção.



Þ     Penina: Decisão do Ministro das Obras Públicas

A base da decisão do Ministro das Obras Públicas é uma Informação do Director do Gabinete Técnico do Plano Regional do Algarve, datada de 28 de Novembro de 1963, da qual citamos o essencial [os sublinhados são nossos]:

“parece admissível dar-se satisfação ao que se pretende – lotes de 5.000 m2 pelos seguintes motivos:

·            a construção dum Golfe nesta zona tem de considerar-se como um elemento altamente valorizador da região no aspecto turístico.

·            este elemento é de muito cara construção (alguns milhares de contos) e conservação (centenas de contos anualmente) pelo que raramente surgem iniciativas privadas e muito menos de organismos de carácter público, para o seu estabelecimento.

·            se o plano concebido pela empresa para dotar a região de elemento tão valorizador e tão caro, implica a autorização da construção de moradias, em parte da propriedade, para refinanciamento da operação e se a Sociedade ainda se propõe a desejável construção dum hotel, como já está autorizada, julga-se não se criar qualquer precedente inconveniente ou abrir-se injusta excepção, concedendo-se a referida autorização, em princípio, tendo em vista o interesse público do conjunto das realizações.

·            o facto de se pretender um loteamento de 5.000 m2 dá garantia de se poder projectar uma solução de bom nível, cuja apresentação, no entanto, se aguarda para apreciação e possível aprovação definitiva.”.

Respeitada a via hierárquica do Director Geral da DGSU, o Ministro despacha, em 12 de Dezembro de 1963:

·          “Concordo, sob condição porém de ficar garantida a prioridade de execução dos elementos de interesse turístico – designadamente as instalações hoteleiras e o campo de golfe – para o que a empresa poderá oferecer satisfatória caução a favor da C.M., por exemplo.

·            Como é óbvio constituirá também condicionamento a respeitar a precedência da execução das obras de infra-estruturas – acessos, arruamentos, água, esgotos, electricidade, etc. – para a qual se fixará um prazo que não ultrapassa Dez. 1965. Em princípio estas obras são inteiramente custeadas pela empresa mediante projectos aprovados pela C.M. depois de visados pelo Gabinete do Plano Regional do Algarve.

·            O licenciamento das diferentes construções pela C.M. só poderá ser efectuado uma vez visados e aprovados pela mesma forma os respectivos projectos e verificado o cumprimento das condições prévias que ficam estabelecidas neste despacho.”.



Þ     Vale do Lobo: Decisão do Ministro das Obras Públicas

No caso de Vale do Lobo, o processo é mais curto. A 24 de Fevereiro de 1964, o Ministro das Obras Públicas concorda com a Informação do Director do Gabinete Técnico, datada de 18 do mesmo mês:

“Tal como ficou decidido para um caso semelhante – Hotel do Golf, da Sociedade Penina – julga-se justificável autorizar-se a construção de moradias e manutenção dum Golf. Nestas condições tenho a honra de propor que:

a)seja aprovado a inclusão de moradias nesta zona;

b)que a construção de moradias só possa iniciar-se após a construção do golfe;

c)que os projectos das moradias e sua implantação de conjunto sejam previamente submetidos á aprovação da Direcção Geral.”.



Þ     Sobre a Aplicação das Decisões do Ministro das Obras Públicas

Na Penina,

·          Hotel e Golfe são construídos antes do verdadeiro começo das vendas de moradias, por razões comerciais: aumento de preço,

·          não encontramos traça do respeito das exigências sobre as obras de infra-estruturas,

·          o Alvará de Licença de Loteamento de Setembro de 1968 confirma que a exigência da área mínima de 5.000 m2 não é respeitada.

Em Vale do Lobo, não dispomos de informação sobre o respeito destas exigências. Só uma análise de arquivo permite avaliar até que ponto as exigências não foram respeitadas.

A análise dos processos de licenciamento coevos mostra que muitas das exigências oficiais não eram cumpridas.



Þ     Cinquenta Anos Depois

O conjunto da Penina, apesar de ainda não ter valorizado todo o seu potencial, é uma referência da Oferta de Turismo do Algarve. As Moradias alojam residentes permanentes locais (portugueses e estrangeiros), proprietários em estadias temporárias e turistas, a quem são alugadas como Alojamento Local.

Em Vale do Lobo, os primeiros lotes são vendidos antes do Decreto-Lei sobre Loteamentos Urbanos. Publicada esta legislação, encontramos referência, sem querer ser exaustivos, a Loteamentos datados de 1967-1968-1969-1970-1972-1973-1983-1987-1988.

O empreendimento é classificado como Aldeamento Turístico, no quadro do Decreto Regulamentar de 1978, mas pede a desclassificação, face às exigências excessivas da Lei Hoteleira de 1986. É exemplo da inexistência de Modalidades de Alojamento Turístico susceptíveis de Classificar a Oferta Turística “real”, que o mercado valoriza e do mercado dispensar a Classificação.

Recentemente, é aprovado o “Vale de Lobo III”, exemplo de uma dinâmica de “arredondamento”, de que nos ocuparemos no futuro.



b)Inovar em 2012



Þ     Duas Diferenças

Entre 1962/1964 e 2012, há duas diferenças relevantes. A primeira é fundamental e obriga a uma mais forte decisão política

·          em 1962/1963, é a Europa da Abundância e uma procura em crescimento acelerado, pela transferência de estadias dos «mares do Norte» para o Mediterrâneo e o alargar do acesso às férias no estrangeiro,

·          em 2012, vivemos o Período do Após Crise de 2008/2009, com efeitos estruturantes na formação da procura pela viagem de estadia: menos rendimento disponível e propensão para viajar/comprar casa do tempo livre, incerteza sobre o tempo livre, excesso de oferta e concorrência acrescida.

A segunda diferença consiste

·          no reforço dos Estrangulamentos Culturais (Documento1), sedimentados pela Politica e Serviços de Turismo, ao longo de cinquenta anos, com o apoio de interesses económicos e sociedade civil do turismo,

·          na dificuldade em o Ministério da Economia tomar Decisão Inovadora, à altura da de Eduardo Arantes e Oliveira em 1963,

·          na urgência da Decisão Inovadora, pelo que a Economia “real” do Turismo representa para a Balança de Pagamentos e criação de emprego.



Þ     Qual Decisão Inovadora?

A primeira Decisão é responder a uma pergunta simples: como pode o Governo fomentar a criação de valor, a partir de um largo conjuntos de activos

·          dezenas de empreendimentos turísticos, que, como Penina e Vale do Lobo estão fora do âmbito da Politica e Serviços de Turismo,

·          cerca de 145.000 Fogos de Uso Sazonal, que são investimento de mais de cem mil famílias, que merecem e querem ver valorizado o seu investimento no Turismo do Algarve – a Valorização da Oferta no Villa Rentals é exemplo inquestionável de acção urgente,

·          um número desconhecido de Reformados do Tempo Livre, em residência permanente?

A segunda Decisão é mais estrutural e consiste em o Governos Inovar no fomento de três Novas Dinâmicas da Economia do Turismo:

·          Integração da Cadeia de Valor do Turismo Residencial,

·          Portugal, País Competitivo na Atracção de Reformados Não Residentes,

·          Diversidade e Nova Dimensão da Diáspora Portuguesa.

O explicitar destas Dinâmicas, brevemente em mais um O Algarve à Sexta.

A Bem da Nação

Albufeira 6 de Abril de 2012

Sérgio Palma Brito

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